quarta-feira, 26 de maio de 2010

Onérea



Roubava sonhos,,,

Roubava sonhos. Não sonhos de quando se sonha, sonhos de quando se dorme; não como se roubam os dinheiros, mas como se roubam os valores, também, roubo não seria a palavra exata para tal ato, seria mais como uma divisão forçada, como um gato de TV a cabo. Via o que os outros sonhavam, sem que esses deixassem de sonhar, sem que esses soubessem da sua presença nebuliforme. Depois, sorrateira, colocava tudo no papel. Os sonhos não eram dela, mas as palavras eram e todas muito bem descritas. Não servia para publicar, mas para inflar o ego. Dizia não poder publicar por não ter as devidas licenças. Dizia também que seu oficio não era o de escritora e sim descritora.

Quando dormia, viajava o mundo com os olhos, até que achasse um sorriso dorminhoco de vítima. Então, o mundo se desmundava a mostrar suas belas cores.

Tinha gente que sonhava com romances em sépia, tinha gente que sonhava com coisas que voavam, tinha gente que sonhava com suspenses soturnos, e crianças que sonhavam com guerra. No seu trabalho de descritora, já havia descrito de tudo e ainda assim haviam muitos mundos a serem explorados. Gostava mesmo era de visitar os sonhos dos velhinhos, esses sempre tranqüilos como que esperando uma velha visita que não tardaria muito. Muitos sonhos, muitos tesouros e quando acordava já de manhã, chorava. Não por não ser real, mas é que as pessoas já nãom dava valor aos seus sonhos, preferiam ter a coisas sempre substratas, sempre supérfluas. Mesmo assim, continuava a invejá-los todos, porque não tinham que viver de sonho dos outros, porque tinham seus próprios devaneios. Ela não, e como não sonhava, não descansava, o corpo estacava, mas a mente maquiava, mesmo em outras terras menos concretas.

E o mundo de verdade era sufocante, sempre mais cansada de que o ontem, seguia já bem bamba na sua máscara de colunista de um jornal que não vendia muito. Tudo era tão sem sal, sem sonho nem nada.

Sempre sem se queixar, sempre mais cansada que o ontem, houve o tempo em que andava tão preocupada com tudo que não conseguia mais dormir, sem dormir, não sonhava; sem sonhar, não vivia; sem viver já não se bastava.

Decidiu que para ser levada pelo rio, teria que livrar os pés do concreto, ir viver no mundo dos sonhos, seu reino tão encantado.

Aqui, ficou apenas uma pequena coluna no jornal em que trabalhava: Fulana da Silva, você sempre será lembrada; e logo foi esquecida.

Do lado de lá, sorria agora sem peso no corpo, sem corpo, sem culpa. E visitava as vezes o sonho dos parente que era para que matassem a saudade.

De herança deixou apenas um punhado de escritos sem pontuação, acentos, sem sentido, que ninguém que nunca entenderia.

De Antonio Ganzer

Com uma grande ajuda de uma grande amiga,

Mirian Conci.

quinta-feira, 13 de maio de 2010



Saveiro

Restei em sombra, a meia-luz, a meia-volta, a meia-vida.

Restei silêncio, rouco.

Restei diverso, pouco.

Restei inverno.


Parti, algo grande em mim morreu

E no lugar profundo daquele eu

Eu nenhum outro nasceu


A vida que eu vejo distante passar

Já não é mais minha, torta

E não é mais viva, morta

É um barco errante em alto-mar

- A naufragar, a naufragar


Foi o vento bruto, de qualquer lugar

Rompeu o mastro, rasgou as velas

Cruzou no infinito as paralelas

Fez-me órfão de porto-lar

- Desencontrar


Nadei, nadei a me agitar

Mas não houve santo milagreiro

Nem reza de bom marinheiro

Que me fizesse parar

- De afundar, de afundar

Arthur P. Bedin